"Uma criança é como o cristal e como a cera. Qualquer choque, por mais brando, a abala e comove, e a faz vibrar de molécula em molécula, de átomo em átomo; e qualquer impressão, boa ou má, nela se grava de modo profundo e indelével." (Olavo Bilac)

"Un bambino è come il cristallo e come la cera. Qualsiasi shock, per quanto morbido sia
lo scuote e lo smuove, vibra di molecola in molecola, di atomo in atomo, e qualsiasi impressione,
buona o cattiva, si registra in lui in modo profondo e indelebile." (Olavo Bilac, giornalista e poeta brasiliano)

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Por que crianças até 10 anos não deveriam sofrer



Google Imagens

Por Cintia Liana Reis de Silva


Quanto mais me aprofundo no estudo da mente humana e infantil constato que adultos e crianças são vítimas de uma educação completamente equivocada, desrespeitosa, onde ainda não existe espaço para a psicologia, a ciência da mente.

A minha preocupação central neste texto é explicar porque crianças até os 10 anos não deveriam sofrer ou experimentar vivências traumáticas, de estresse ou de tristeza. Mas isso é possível? E Porque? Sim. É possível criar um ambiente saudável e sereno para o crescimento dos filhos, conhecendo a mente infantil, e isso vai depender da saúde emocional dos pais e do preparo que tiveram e buscam para viver este papel.

E porque crianças não deveriam sofrer? Estudos clínicos já estabelecem a profunda relação entre as patologias modernas, dependências, impulsos, etc, com a vivência de sentimentos negativos na infância, até os 10 anos de idade.

Experiências traumáticas são todas as experiências que trazem sentimentos desagradáveis à mente infantil, ao contrário do que se pensa comumente, que se tratam somente de experiências muito fortes na ótica do adulto. Acontece que na ótica da criança existe uma amplificação do impacto do sofrimento, por causa da vulnerabilidade emocional e pelas características da sua própria estrutura mental imatura.

Posso dar exemplos de traumas, como: Separação dos pais, onde ela é privada de conviver mais ativamente com umas das figuras e não entende bem a situação, confundindo com abandono e sentindo intensamente como tal; o desmame abrupto ou quando a criança ainda não está pronta; quando é obrigada a ir e a ficar na escola nos primeiros dias, sem que ela queira ou que haja um período de adaptação; quando tem pais competitivos, que medem forças com ela por medo de não desenvolverem o senso de autoridade e impõem o uso do poder em pequenas tarefas e situações do cotidiano causando pequenas brigas, ao invés de flexibilizar quando se deve para que não ocorra conflitos; a falta afetiva de uma figura paterna ou materna (mesmo que substitutiva); ser obrigado a dormir na própria cama quando se está com medo de dormir sozinho por algum motivo, chegando a vivenciar uma sensação de pânico, como num centro de concentração; chorar muito e repetidamente no berço nos primeiros meses de vida, quando o natural é querer colo e o aconchego dos braços maternos; ser abusado sexualmente, etc. Não digo que a criança não deva se frustrar, a frustração faz parte da vida, o "não" também, eu falo de sofrimento desnecessário. Essas tristezas, choros e faltas para a mente infantil são monstros que se criam e crescem, verdadeiros vazios, lacunas que nunca mais poderão ser preenchidas em outros momentos ou etapas da vida do indivíduo.

Devo lembrar que crianças castigadas ou maltratadas desenvolvem uma falta de integração do ego, que fica isolado sem ser sintetizado ao interno da memória autobiográfica. (CARETTI e BARBERA, 2012)

Essas e outras experiências traumáticas vividas na infância podem patologizar as defesas dissociativas, isto é, as tendências naturais do sujeito de regular suas emoções de modo saudável. Essas defesas dissociativas têm uma função mental que possuem mecanismos que colocam em reparo a consciência ordinária através de um excesso de estímulos dolorosos, quando ao mesmo tempo recebe uma carga de hormônios característicos. (CARETTI e BARBERA, 2012)

Quando os traumas e tristezas que as crianças são submetidas colocam abaixo as defesas naturais, o adulto de amanhã encontra-se sem defesas para suportar estresses do presente e as memórias passadas, que não são esquecidas jamais, ao contrário, elas latejam pela eternidade e aparecem, mesmo que inconscientemente, em novas situações que lhe parecem já conhecida, como nas novas relações amorosas pode reaparecer o medo de ser abandonado ou o sentimento de rejeição, por exemplo.

A figura de apego deve passar segurança e constância, como também ser uma base de bons sentimentos, para que a criança desenvolva uma mente organizada e diminua as chances de um déficit metacognitivo nessa dialética. A desorganização psíquica emerge de um apego traumatizado e incide na capacidade de integração de aspectos emocionais e da experiência. O sentido de desintegração psíquica é provocado pelas emoções dolorosas. (CARETTI e BARBERA, 2012)

A formação do adulto maduro depende diretamente da boa relação com as figuras de base e do nível de maturidade dessas.

Essa desorganização, desintegração psíquica, a vulnerabilidade ao estresse, provocadas pela falta das defesas dissociativas em virtude das experiência traumáticas e desgostosas infantis levam o indivíduo ao craving, conceito muito analisado na literatura científica, e foi definido como uma “urgência patológica”, uma “fome irresistível”, uma “necessidade imperiosa”. (CARETTI e BARBERA, 2012)

O craving é visto nas dependências comportamentais ou de substâncias, como de substâncias estupefacientes, nos toxicomaníacos, como alcoolistas, usuários de drogas; nos maníacos por compras, sexo, internet, assim como nos impulsivos e obsessivos, que podem estar nesses maníacos já citados; ou até nos que se sentem desconfortáveis socialmente, buscando o isolamento por ser incapaz de relacionar-se de forma prazerosa com os outros. Ou seja, o craving é encontrado em uma dependência patológica, na qual o indivíduo tem um desejo incontrolável através um estímulo de reforço como forma de atenuar as suas dores e frustrações, já que as suas defesas naturais lhe foram tiradas lá no início de sua vida com os sofrimentos vividos.

Existem muitos tipos de terapias, métodos e técnicas terapêuticas que podem trabalhar esses traumas de forma rápida e eficaz, como as constelações familiares, a terapia floral, a somatic experiense, o Acess Bars, o EFT, a Logosintesi, etc. Em alguns casos, é necessário o uso de farmacoterapia atrelada ao tratamento psicológico, porém devo dizer que o acompanhamento psicológico é a saída mais saudável e é insubstituível, porque o indivíduo precisa se conscientizar de seu processo e resignificá-lo. É preciso se dar conta e tocar nessas feridas para curá-las.

O adulto feliz, maduro, que busca se realizar e ter um equilíbrio emocional de um modo mais fácil, normalmente foi uma crianças que cresceu sem precisar guerrilhar e combater tanto com pais infantis, egoístas, competitivos e raivosos. Todo ser humano tem traumas, mesmo que não os tenha visto ou se dado conta ainda, alguns mais, outros menos e se acredita muito na capacidade de resiliência desse ser humano. O importante é conhecer-se para crescer e se preparar para ter filhos mentalmente saudáveis para serem adultos felizes.

Quem já tem filhos, cuide hoje do adulto de amanhã. Consulte sempre um psicólogo, pois o médico conhece e cuida somente do físico, o psicólogo entende e cuida da mente, e eduque com consciência, justiça e respeito.

Referência: Caretti, V e Barbera, D. La. Le nuove dipendenze: diagnosi e clinica. Carocci Editore, Roma, 2012.


Cintia Liana Reis de Silva, psicóloga, especialista em psicologia de casal, família, infância e adoção, seu blog recebe mais de 15.000 visitantes ao mês, o http://www.psicologiaeadocao.blogspot.com.

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