"Uma criança é como o cristal e como a cera. Qualquer choque, por mais brando, a abala e comove, e a faz vibrar de molécula em molécula, de átomo em átomo; e qualquer impressão, boa ou má, nela se grava de modo profundo e indelével." (Olavo Bilac)

"Un bambino è come il cristallo e come la cera. Qualsiasi shock, per quanto morbido sia
lo scuote e lo smuove, vibra di molecola in molecola, di atomo in atomo, e qualsiasi impressione,
buona o cattiva, si registra in lui in modo profondo e indelebile." (Olavo Bilac, giornalista e poeta brasiliano)

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Os Orfãos Sociais do Brasil

Tenho a honra de apresentar aqui um texto de Jotacê Freitas, marido de minha mãe e grande amigo meu, pessoa com quem eu aprendo muito.

Foto: Google Imagens

*Por Jotacê Freitas

Escrito em março de 2007

“(...)Não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar."
Bertold Brecht

País dos contrastes, o Brasil acaba de pôr em jogo mais uma lei de adoção. Até então só podiam ser adotadas crianças que os pais tivessem morrido e fossem doentes terminais. Com a nova mudança na lei as crianças abrigadas em orfanantos poderão ser adotadas também por estrangeiros, desde que os pais dêem uma permissão aos interessados.Isso tem causado uma polêmica entre duas correntes de ‘compreensão’ dos direitos das crianças. Por um lado um grupo acha que é melhor que as crianças que têm família possam também ser adotadas, enquanto o outro grupo, teme que essa adoção venha causar mais danos a essas crianças, como o caso de venda de órgãos, trabalho escravo, abuso sexual e, que seria obrigação do Estado dar a essas famílias, aliás, a todos os cidadãos, condições para se manterem com honradez e dignidade. É o que está na Constituição Federal que ironicamente garante esse direito apenas com um salário mínimo.

Enquanto o tempo passa e as discussões seguem estéreis as crianças vão crescendo nos orfanatos e a idade avançada torna-se um fato negativo para sua adoção por uma família adotante.

Os centros das nossas cidades estão cheias de crianças nas sinaleiras e nenhuma medida é tomada para acabar com isso. O estatuto da criança e do adolescente com sua ‘proteção’ aos direitos da criança não admite que elas sejam ressocializadas em instituições de reclusão, pois estas acabaram se tornando faculdades para a marginalidade. Os maus tratos por parte dos órgãos públicos e a promiscuidade com que eram agrupados não foi positiva para educá-las e transformá-las em cidadãs. As escolas atualmente não passam de meros depósitos de crianças para o aumento da verba educacional e o desestímulo escolar, provocado por esse descaso, leva a criança para a rua e mesmo professores “comprometidos” não têm poder de influência sobre elas que vêem na rua uma solução imediata para solução dos seus problemas mais básicos e emergentes: comida e lazer.

Governo nada faz e as crianças vão crescendo nas sinaleiras, sob viadutos, em bancos de praças, exércitos do tráfico, órfãos sociais do Brasil, terra do Carnaval e do Futebol, até virarem índice de vítimas dos grupos de extermínio.

Os Juizados de Menores estão abarrotados de meninos e meninas que sofreram maus tratos dos pais e/ou familiares e, por não verem condições neles de criarem essas crianças, mantêm-nas sob sua guarda, enquanto os pais e os filhos são acompanhados psicologicamente até o momento do retorno ao lar. Raramente isso ocorre, as condições socioculturais dessas pessoas são precários e há pouca probabilidade deles se estabelecerem moral, social, afetiva e economicamente bem. A falta de oportunidades é gritante e a tendência é que esse abismo que separa os poucos abastados dos muitos despossuídos aumente cada vez mais.

Talvez o planejamento familiar seja a solução, mas tem encontrado barreira entre os grupos mais conservadores, principalmente os religiosos. E apenas o planejamento, sem uma mudança na escala social, não resolveria a questão, senão estaríamos apenas reduzindo o número de miseráveis de maneira controlada e científica, assim como se faz com as cobaias nos laboratórios.

Para o cidadão comum, o menor, o pivete, o moleque de rua, não passa de um marginal que tem que ser eliminado do convívio social, a qualquer custo. Ele espera a segurança pela qual paga com seus impostos. Não percebe o quanto essas crianças são vítimas do seu egoísmo, da sua alienação e insensibilidade social.

Os especialistas nos orientam a não dar esmolas a essas crianças para que elas não fiquem ‘viciadas’ na vadiagem e mendicância, mas até o momento nenhuma sugestão foi dada ou exigida do Governo para solucionar o problema. Dinheiro é o que não falta em nosso país, vemos constantemente na imprensa casos de desvios de verbas milionárias feitas pelos políticos e nada acontece, ninguém é preso e quando isso ocorre o dinheiro não volta mais aos cofres públicos pois já foi pulverizado em plantações de ‘laranjas’.

É óbvio que apenas a campanha do ‘não à esmola’ não resolverá o problema, o buraco é bem mais embaixo, precisamos de uma atitude contra a desonestidade reinante em nossa nação que tanto tem sangrado as veias dos pobres e honestos trabalhadores e desempregados das periferias.

*Jotacê Freitas, poeta e professor do Ensino Fundamental.

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